terça-feira, 7 de setembro de 2010

Aconchego


" Se não era para ser, se o seu coração não está pronto para se abrir, e se você o fizer eu não verei, está em pedaços."
Como diz nesta música do  Dj Tiesto, Empty Streets, quando não está escrito para acontecer, não acontece.
Eu tinha quatro, cinco anos talvez, porém mesmo tenho  dezoito, ainda me recordo bem desse dia que marcou minha vida para sempre, absolutamente. Não falo disso com tristeza e sim com respeito, já que envolve pessoas e seus sentimentos.
Enfim, era uma quarta-feira como qualquer outra. Acordei, tomei café vendo meus desenhos - que eram bem diferentes dos de hoje -, tomei um banho e fui para a escola com a Dete. Como eu adorava aquela mulher, que foi a única que me tratava com carinho. Ela foi minha babá durante algum tempo, e foi a melhor, estou certo disso.
Estava frio, porém sem chuva. Lembro que fui com ela até a padaria comprar meu Kinder Ovo - que na época era um real - e depois voltamos para a casa, logo após a escola. Fiquei acompanhado dela até minha mãe chegar, quando fiquei somente em sua companhia. Passado algum tempo meu pai chega. Frio como sempre mal dá boa noite, mas coitado, a rotina o cansava muito para dizer isso a esposa, não é mesmo?
Para ser sincero, eu que tenho uma boa memória, não tenho na minha mente a visão dos meus pais se beijando, nem fazendo um carinho, nem nada.
Uma dúvida: a rotina pode acabar com um relacionamento? Espere.
Voltando para a quarta-feira, ainda me vejo em um clima totalmente estranho e diferente de tudo que já havia presenciado. Minha mãe me encaminhou para o seu quarto, já passava das nove da noite.
Estava vendo televisão, ouvindo gritos e discussões. Não me surpreendi, era tão normal que estranhava quando não acontecia. Depois de uns vinte minutos, um silêncio perturbador entra em cena. Uma paz para os meus ouvidos no meio de tantos berros.
Fui até a sala e não havia ninguém. Olhei pela janela,  vi sinais de chuva e o portão encostado revelava que alguém tinha passado por ele recentemente. Procuro minha mãe - sempre fui mais agarrado com ela -. Ouvindo um soluçar no banheiro, vou até lá e abro a porta. Me deparo com minha mãe sentada no chão e chorando. Um pouco confuso, não entendi porque ela me estendeu seus braços e me puxou com uma sede tão grande de mim, me dando o abraço mais apertado da minha vida. Sem entender nada e na minha inocência, disse: " Não chora mãe, ele volta." Felizmente ele não voltou, e sim, meus pais haviam se separado.
O que é uma família? Você, sua mãe e pai, juntamente com seus irmãos? Tecnicamente sim, na prática nem sempre.
Família para mim são aqueles que te querem bem e convivem bem entre si, laços de sangue são dispensados.
Uma certeza: nunca tive uma família tradicional. A vida de uma criança pequena com pais recém-separados pode ser bem complicada. Sorte que sempre tem um anjo em nossas vidas e o meu foi a minha avó. Morei com ela e com meu avô dois anos, talvez.
Na minha cabeça, minha casa era constituída por dois pais e não por um só, quando eu estava com a minha mãe, queria meu pai e quando estava com ele, queria ela. Via pouco meus pais. Os dois juntos no mesmo lugar, nem pensar.
Tinha febre, ninguém sabia a causa.
O curioso era que, quando via a minha mãe, a febre sumia.
Na escola todos tinham seus pais. A mãe em geral mais protetora e o pai mais sério e fechado... Eu tinha a minha avó.
Uma ideia de lar? O meu era todo deturpado. Sempre me senti diferente e único, graças a estes fatos.
Meu aconchego era saber que aos sábados veria minha mãe e tudo ficaria bem. Meu pesadelo? Era saber que ela iria embora antes das três da tarde, hora em que meu pai passava para me ver.
Traumatizado? Não sou.
Vivido? Apesar da pouca idade, sim.
Família é importante? É, mas quando a prática funciona como na teoria, se não for assim, melhor deixar que alguém assuma esse papel já que quem deveria de fato não soube como.
As vezes é preciso deixar de encarar uma ilusão e viver a realidade, nua e crua.

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