terça-feira, 7 de junho de 2011

A penteadeira



Acordei cedo, tomei café e fui brincar.
Estava frio. A neve já se fazia presente naquela manhã fria de inverno.
Papai havia saído para trabalhar. Já mamãe, eu a encontrava todos os dias em meus sonhos.
Ficava a maior parte do tempo pensando. Pensava nos amigos, no meu pai, na minha mãe...
Alguns podem até me chamar de sozinha. Mas eu não sou, não.
Prefiro aceitar que sou melhor amiga dos meus pensamentos.
Faço uma verdadeira viagem por todo o universo sem sequer sair do meu mundo...
O tempo está passando, logo vou ouvir aquela buzina. É melhor que eu me apresse.
Hoje no recreio vou comer panquecas, separei duas que meu pai me deixou para o café especialmente para isso.
Hora de me arrumar.
Sento na minha cadeira olhando em direção ao espelho, prendo meus cabelos.
Abro o meu porta jóias e pego alguns mimos que eu ganhei.
Um broche com as iniciais do meu nome, L.S., ou Lindsey Sophie.
Um cordão onde tem uma foto de papai e mamãe dentro, em forma de coração.
Por fim, um par de brincos de pérolas.
Borrifo meu perfume que possui o cheiro das mais variadas rosas e vou para o ônibus.
Como de costume me sento ao final dele,vendo a vida passar, geralmente sozinha.
Aproveito para ir pensando mais um pouco.
Na escola nada demais.
Não tenho amigos lá. Algumas pessoas falam comigo, mas eu sinto o poder de julgar em suas palavras.
Chego em casa ao cair da noite, onde vejo televisão até papai chegar de mais um dia de trabalho.
Televisão. Está sim é uma amiga minha. Tenho uma especialmente no meu quarto.
Então sinto que meu pai está chegando. Eu e ele conversamos um pouco. E então sempre decidimos jantar.
Algumas risadas depois, já é hora de escovar meus dentes.
Ele me leva até a minha cama, onde me cobre e lê pra mim uma história. Ele sempre compara as princesas dos livros comigo.
Mas sabe, não posso dormir agora. Não tenho sono. E mesmo se tivesse, algo ainda está por ser feito.
As luzes estão apagadas. Acendo apenas a luz do meu abajur.
Já está ela. Pequena, frágil e linda. Abro-a com cuidado, ouvindo aquela melodia tocar.
Me lembro como se fosse hoje, papai me dando aquele delicioso presente.
Havia completado meu sexto aniversário... e mesmo três anos depois a sensação que aquela melodia me causava ainda era como a da primeira vez em que eu ouvi.
Paz. Serenidade. Por um momento eu deixava de pensar e agia.
Podia sentir mamãe sentada ao meu lado, comigo ali, apreciando aquele belo momento.
Sinto tanto a falta dela, mas é estranho. Nunca a conheci.
Mas eu sei que ela sempre fala no meu ouvido.
Sou muito parecida com ela. Nossos olhos expressam a mesma mensagem, que é a de um céu em imensa alegria.
Nossos cabelos são tão dourados quanto o maior tesouro do mundo!
Como sinto a sua falta! Todo dia, antes de a encontrar no meu doce sono eu percebo que sua presença está no meu pequeno trono.
Retiro todos os meus pertences, boto todos eles de volta na minha caixinha, dando uns beijinhos carinhosos em cada um deles.
Aprecio mais um pouco. Dou um último suspiro, fecho os olhos e ainda ouvindo a canção tocar, fecho a tampa.
Agora meu sono chegou para me arrebatar para mais uma noite de diversão com a minha eterna amiga.
Uma hora se passou desde que levantei da cama para meu ritual.
Me deito e cubro. Fico imaginando como será o dia de amanhã, esperançosa para que seja todo ele exatamente igual a esse que se passou.
Quero um dia que acabe exatamente assim, onde possa ter meu pequeno devaneio guardando minhas jóias, todas as minhas jóias dentro da minha caixinha, ali na minha penteadeira.

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